USP - Universidade de São Paulo
Universidade de São Paulo

Biomaterial produzido no IQSC é testado para tratar fraturas em animais de grande porte

Equinos sofrem muitas fraturas, principalmente os cavalos esportivos e de trabalho – Arte de Lívia Magalhães com imagem de Pixabay

Um biomaterial produzido no Instituto de Química de São Carlos (IQSC) da USP está sendo testado por cientistas da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da USP para tratar fraturas em animais de grande porte. O produto tem em sua composição hidroxiapatita, quitosana e nanotubos de carbono, com a adição de células-tronco mesenquimais oriundas de medula óssea de ovinos jovens.

Os experimentos, que vêm mostrando resultados positivos, foram conduzidos pela médica veterinária Geissiane de Moraes Marcondes com colaboração de outros pós-graduandos, em seu doutorado no Departamento de Cirurgia da FMVZ, sob a supervisão do professor doutor André Luis do Valle De Zoppa, líder do Grupo de Pesquisa em Ortopedia e Biomecânica Veterinária no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

A médica veterinária explica ao Jornal da USP que os ruminantes (bovinos, caprinos e ovinos), equinos e suínos estão entre os animais que são considerados “de grande porte”. Os experimentos estão sendo realizados com foco principal na aplicabilidade em equinos que, por serem animais de trabalho e esportes, sempre estão mais sujeitos aos traumas ortopédicos graves, como as fraturas cominutivas. “Nesse tipo de fratura, o osso é fragmentado em várias partes dificultando o tratamento”, explica Geissiane. “Acredito que, em cerca de dois anos, poderemos aplicar clinicamente o biomaterial em equinos”, estima.

Nos cavalos, por exemplo, entre as maiores causas desse tipo de fratura estão o coice, entre os próprios animais, e acidentes durante o desenvolvimento de suas atividades, quer sejam de passeio ou esporte. “Há 20 anos, acidentes que causavam essas fraturas levavam os proprietários desses animais a pensar no sacrifício”, descreve a médica. Mas, atualmente, como ela ressalta, existem avaliações mais precisas e o uso de implantes metálicos, placas e parafusos que possibilitam a fixação interna do osso, procedimento conhecido como osteossíntese. Contudo, esses procedimentos, muitas vezes, não são suficientes por causa dos fragmentos gerados numa fratura cominutiva. Com o biomaterial, é possível a reconstituição do tecido ósseo, pois ele é implantado na falha do osso.

O nacompósito à base de quitosana, nanotubo de carbono, hidroxiapatita e células-tronco mesenquimais tem uma estrutura semelhante ao tecido ósseo e é desenvolvido no IQSC pela química Virginia da Conceição Amaro Martins, sob a supervisão da professora Ana Maria de Guzzi Plepis, do Departamento de Química e Física Molecular.

O biomaterial tem uma estrutura porosa semelhante a uma esponja de limpeza, porém mais rígida e não flexível. “O nacompósito é produzido no IQSC de acordo com a medida que necessitamos. O material não é tóxico e, portanto, não há reação do organismo”, garante Geissiane. De acordo com a médica veterinária, o biomaterial funciona como um método auxiliar de preenchimento das falhas ósseas que auxiliam o tratamento com placas e parafusos.

Seringa com célula-tronco mesenquimal e biomaterial – Imagens cedidas pelos pesquisadores

Segundo Geissiane, os pesquisadores do IQSC já trabalhavam com os materiais (quitosana, hidroxiapatita e nanotubo de carbono) de forma isolada. “No meu curso de doutorado usei o compósito unindo os três elementos”, lembra. Ela destaca ainda que a quitosana e a hidroxiapatita já são usadas como material de preenchimento em ortopedia humana e em odontologia. Os nanotubos de carbono foram adicionados ao material por possibilitarem maior força e resistência mecânica.

Resultados animadores

Os pesquisadores estão trabalhando em projetos de pesquisa para o desenvolvimento e aperfeiçoamento do biomaterial. De acordo com Geissiane, os resultados são animadores. “Quando utilizamos o biomaterial, inclusive com as células-tronco, houve rapidez na recuperação, além da produção de um tecido semelhante ao tecido ósseo.” Ela também ressalta que o tecido produzido não é tóxico. “Como os resultados com a adição de células-tronco foram semelhantes, pretendemos ainda realizar novos estudos usando esse material”, explica Geissiane, que continuará seus estudos no tema no seu pós-doutorado.

Segundo a pesquisadora, os experimentos tiveram início em 2016 e os primeiros resultados foram obtidos nos dois anos seguintes. “Vale lembrar que, naquela oportunidade, ainda havia no Brasil limitações tecnológicas com relação às células-tronco”, explica. “Atualmente, como as técnicas estão bastante evoluídas, pretendemos aperfeiçoar o biomaterial adicionado de células-tronco, mas com tecnologias mais avançadas”, afirma.

A pesquisadora também destaca que o estudo conta com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e tem um caráter multidisciplinar, envolvendo a FMVZ, o IQSC e outras unidades da USP, como a Faculdade de Odontologia (FO), com colaboração da professora Luciana Corrêa e do professor Victor Arana-Chavez. As células-tronco mesenquimais são cultivadas no Laboratório de Cultivo Celular do Departamento de Clínica Médica da FMVZ, sob a coordenação da professora Raquel Y. A. Baccarin.

 

Por Antonio Carlos Quinto, do Jornal da USP