Análise Térmica é um conjunto de técnicas analíticas que estudam as propriedades de um material em função de sua exposição ao calor.

Compreender detalhadamente como se comporta uma aeronave nas mais variadas circunstâncias e situações durante um voo é essencial para garantir a segurança do trajeto. Um dos estudos realizados nesse sentido busca entender como as grandes variações de temperatura são capazes de afetar os materiais que compõem a estrutura do avião, visando prevenir que eles sofram deformações que possam gerar algum risco. Para realizar essa tarefa com precisão, pesquisadores do mundo todo recorrem à Análise Térmica – conjunto de técnicas analíticas que estudam as propriedades de um material em função de sua exposição ao calor, seja em cenários de aquecimento ou resfriamento.

Segundo o professor Éder Cavalheiro, do Instituto de Química de São Carlos (IQSC) da USP, todas as informações obtidas através dessas análises contribuem para entender o comportamento térmico de diversas amostras de materiais, além dos limites de temperatura aos quais elas podem ser submetidas sem comprometer suas propriedades. Todo esse mapeamento permite uma série de aplicações, como obter o máximo desempenho de um produto, definir condições ideais de estocagem, melhores estratégias para a degradação de um material, buscando evitar possíveis danos ambientais, estabelecer o uso mais indicado de certas substâncias e medicamentos etc.

Um dos estudos realizados em Análise Térmica é a definição dos limites de temperatura aos quais diferentes materiais podem ser submetidos sem comprometer suas propriedades.

Embora o tema seja de grande relevância, seu ensino em cursos de graduação do Brasil não é tão presente, pois, entre outros motivos, a tradução para o português da literatura científica mundial sobre o tema ainda é limitada, além do custo relativamente alto para a aquisição de aparelhos que viabilizem a realização de experimentos nos laboratórios didáticos. Pensando em fortalecer a difusão de Análise Térmica no País, a ex-aluna de mestrado do IQSC, Gabriela Denari, desenvolveu, durante sua dissertação, uma apostila que reúne conceitos históricos, teóricos e experimentos práticos, capazes de facilitar a compreensão do conteúdo pelos alunos. No material, foram abordadas as técnicas termoanalíticas utilizadas com maior frequência, como a Termogravimetria (TGA), Termogravimetria Derivada (DTG), Análise Térmica Diferencial (DTA) e Calorimetria Exploratória Diferencial (DSC).

De acordo com o professor Éder, o material atua como um facilitador do aprendizado, já que ajuda os estudantes a terem maior domínio das técnicas e dos detalhes que influenciam em seus resultados. “A disponibilidade de uma apostila que compilasse história, conceitos e experimentos termoanalíticos em português é pequena. Os trabalhos sobre análise térmica eram praticamente todos em inglês e, de certa forma, tinham oferta limitada, pois, em algumas instituições e universidades, o aluno sequer tinha acesso aos materiais escritos em outra língua”, revela o docente. Para Gabriela, além das técnicas termoanalíticas praticamente não serem apresentadas aos alunos de graduação, os poucos textos em português sobre o assunto nem sempre propunham experimentos didáticos e continham informações restritas sobre o histórico das técnicas.

Preparação do conteúdo – Para retratar a história da Área de Análise Térmica na dissertação, a ex-aluna do IQSC fez um levantamento bibliográfico sobre o tema reunindo informações disponíveis em livros, bases de dados e publicações em periódicos renomados internacionalmente, como Thermochimica Acta, Journal of Thermal Analysis and Calorimetry e Journal of Chemical Education. Além da pesquisa, Gabriela também realizou entrevistas com referências da área no Brasil: os professores Massao Ionashiro, da Universidade Estadual Paulista (UNESP), Lázaro Moscardini, do Centro Universitário de Lavras (UNILAVRAS) e Jivaldo Matos do Instituto de Química (IQ) da USP.

Embora o tema seja de grande relevância, o ensino de Análise Térmica em cursos de graduação do Brasil não é tão presente.

Após estruturar a linha histórica, a especialista deu início à apuração dos experimentos que gostaria de utilizar em sua apostila, consultando novas publicações científicas, boletins de fabricantes de equipamentos, além de outros livros. O foco era encontrar experimentos fáceis e rápidos de serem executados e que fossem contextualizados, de forma que pudessem mostrar a utilização prática dos equipamentos e demonstrar aspectos importantes da teoria envolvendo aplicações cotidianas. Além disso, a ideia foi buscar experimentos voltados para utilização em diferentes áreas, entre elas, na caracterização de fármacos e materiais. Ao todo, foram propostos seis experimentos, os quais passaram por adaptações para se tornarem mais didáticos e foram colocados em formato de roteiro de aula prática.

“Esses experimentos podem ser reproduzidos tanto por quem possui equipamentos adequados em centros de pesquisa, como por aqueles que não possuem, uma vez que lançamos seções de estudos de caso em cada proposta, onde são apresentados gráficos prontos”, explica a ex-aluna. Ela diz ainda que as seções da apostila foram pensadas para colocar o estudante no papel ativo do conhecimento, ou seja, para que ele não siga apenas uma receita pré-determinada de um experimento, mas que pense e reflita sobre aquela prática simulando uma situação-problema.

Aplicação do material – Para avaliar o efeito didático do material desenvolvido, Gabriela e Éder propuseram um curso extracurricular de 30 horas sobre o tema, intitulado “Princípios e Aplicações de Análise Térmica”, no qual foi oferecido aos alunos a apostila com todas as instruções teóricas e práticas, envolvendo textos, dinâmicas e experimentos. A iniciativa, que foi apoiada pela Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária (PRCEU) da USP, contou com a participação voluntária de 12 estudantes de graduação e três de pós-graduação, vindos tanto do IQSC, como da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC), da UNESP e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

A avaliação do curso foi feita com base em questionários respondidos pelos alunos sobre a expectativa em relação à atividade, seus conhecimentos prévios e aqueles obtidos ao final do curso. Entre os aspectos mencionados pelos participantes, o feedback revelou uma melhora na compreensão e no entendimento dos fundamentos das técnicas termoanalíticas. Para alguns estudantes, por exemplo, Análise Térmica se resumia apenas à Termogravimetria e, depois do curso, ficou claro de que se trata, na verdade, de um conjunto de técnicas que investigam propriedades de amostras em função de uma variação de temperatura. Além do ganho de conhecimento observado, a ex-aluna do IQSC afirmou que a apostila desenvolvida teve boa aprovação por parte dos alunos – 92% dos participantes do curso avaliaram o material com nota máxima.

A dissertação de mestrado e a apostila desenvolvidas podem ser acessadas gratuitamente no repositório de teses e dissertações da USP. Atualmente, a dissertação de Gabriela conta com mais de 52 mil downloads, número que impressionou os autores: “Existem ótimos materiais escritos por professores e pesquisadores e que não estão disponíveis livremente na rede. Por isso, um dos fatores que pode ter relação com o grande número de downloads do trabalho é o fácil acesso aos documentos que tratam do tema. Acredito que este material auxilia estudantes e outros pesquisadores a contextualizarem e reafirmarem a importância das técnicas em seus trabalhos”, finaliza a ex-aluna.

Texto: Henrique Fontes – Assessoria de Comunicação do IQSC/USP
Fotos: Pixabay

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